Ingrid Bergman - Um vulcão escandinavo
É redundante explicar porque é que Ingrid Bergman é uma actriz importante. Icónica. Talentosa. Incontornável. No entanto, e isto é inconcebível para alguns, há quem não saiba quem foi a mais famosa intérprete do cinema sueco. Europeu, até, embora com uma carreira feita quase na sua maioria na indústria americana. Em 1999, o AFI reconheceu-a como a quarta actriz mais icónica da História do Cinema, apenas superada por Katharine Hepburn, Bette Davis e Audrey Hepburn. A vida de Bergman é tão cativante e turbulenta como a sua carreira: o seu romance com um casado Roberto Rosselini, e posterior gravidez, chocou Hollywood numa altura em que Bergman era a sua mais respeitada actriz e tornou-a numa pária; a sua vontade de ser verdadeira a si mesma colocou-a em choque com a Igreja, com os Estúdios, com o público. Mas Ingrid Bergman é a prova absoluta de que se pode ser fiel ao que se deseja e continuar a rasgar tabus de alto a baixo. A sua carreira, de cinco décadas sempre vista como um exemplo, prova-o.
Bergman chega a Hollywood depois de 3 anos a subir num cinema sueco que ainda não recebera a benção eterna de outro Bergman realizador, e no Cinema Alemão que já sobre o domínio da propaganda nazi, incomodava a sua disposição mais liberal. No entanto, foi imediatamente notada não só pela sua beleza, como naturalidade. Ajudava que, ao contrário de outra actrizes europeias que fizeram a transição para Hollywood nesta altura, como Dietrich ou Garbo, Ingrid era fluente em várias línguas desde jovem, incluindo o Inglês. Na década de 1940, depois de ser recebida como um entusiasmante novo talento, Bergman faz uma sequência de filmes que lhe valeriam honras de Óscar e de culto: “The bells of Saint Mary’s”, “Gaslight” – o seu primeiro Óscar – colaborações com Hitchcock em “Spellbound” e “Notorious” e claro, “Casablanca”. Com Bergman, há sempre “Casablanca”. A sua Ilsa Lund tornou-se a sua personagem definitiva, de uma das definitivas do Cinema como Arte e Entretenimento. De tal forma que quando a franchise “Missão Impossível” contratou Rebecca Ferguson, actriz sueca, para interpretar uma bela mulher misteriosa no meio de intriga de espionagem, nomeou-a de Ilsa… Faust. Bergman achou menor o filme de Michael Curtiz, a personagem vulgar e pareceu chateada pelo facto de toda a gente lhe fazer mais perguntas sobre “Casablanca” do que sobre qualquer outro filme; e quando, desiludida com os papéis que Hollywood lhe dava, regressou à Europa para trabalhar, e não só, com Roberto Rosselini, ficou claro que as suas ambições eram outras.
E mesmo que a sua carreira lhe tenha trazido mais Óscares, filmes – incluindo com o tal Bergman que realizava, “Autumn’s sonata” – aquilo pelo qual lembramos esta magnífica actriz é a sua face, a maneira como consegue exprimir emoções e sentimentos opostos sem se atropelar ou evitar, como parece estar constantemente no ecrã em actividade mental, a pensar, a raciocinar, a calcular, enquanto muitas actrizes do seu tempo, quando confrontadas com a cena, com o diálogo, se limitam a trancar os seus olhos nos do actor ou actriz do outro lado. Cada close up é um tesouro e cada movimento dos olhos, aquele olhar que desarma ou crucifica ou seduz é um trunfo maior de uma actriz capaz de sobreviver em qualquer estilo, registo ou direcção. Ao ser capaz e mostrar vontade de explorar todas as cinematografias que conseguisse, Bergman foi provavelmente a primeira actriz verdadeiramente internacional, com carreiras igualmente importantes e bem sucedidas em ambos os lados do Atlântico. Como referido em cima, é redundante explicar a sua importância. São assim os ícones.