Tony Leung Chiu Wai - Pequeno grande Tony
Olhando aos ícones do cinema oriental, é impossível não lidar com Tony Leung, provavelmente o mais popular e talentoso actor do espaço chinês nas últimas décadas. Digo espaço chinês, porque Leung nasceu em Hong Kong e foi na frenética indústria cinematográfica da ilha que cresceu. O seu primeiro grande filme de destaque, curiosamente, fê-lo com o Taiwanês Hou Hsiao-Hsien: “A city of sadness, filme que ganharia o Leão de Ouro em Veneza; mas a sua incapacidade em ser reconhecido como actor principal – ainda que seja um, por exemplo, em “Hard boiled”, de John Woo – quase levou a que abandonasse a carreira no seu começo. No entanto, trabalhar com Wong-Kar Wai em “Days of being wild” levou-o a apaixonar-se de novo pela a arte e a embarcar numa das relações mais frutíferas de realizador/actor da História de Cinema. Com Wai, Leung fez de seguida “Chungking Express”, “Happy Together”, “In the mood for love” e “2046”, no auge criativo do revolucionário relizador de Hong-Kong. Numa indústria centrada em filmes de acção, comédias e épicos de artes marciais, Wai mergulhava nas ruas de Hong Kong, no romance co-dependente, na solidão, nos mundos pop de uma ilha a rebentar pelas costuras onde todas as histórias se podem cruzar. Leung acabou por ser, com Takeshi Kaneshiro e Leslie Cheung, a forma corpórea da sua visão do mundo.
O que distingue Tony Leung de muitos dos seus contemporâneos é a forma como não se incomoda de não brilhar. A internalização das emoções é enganadora, mas talvez seja um reflexo da natureza introvertida do próprio Leung. No entanto, não é exagero dizer que Leung é talvez o actor que melhor fala com os olhos num ecrã de Cinema. Os seus papéis no filmes de Wai radicam na cara neutral, mas quase em ebulição de Leung: o polícia 633 sofre de amor, mas caminha as ruas de Hong Kong aparentemente com a indeferença dos doridos; o Lai de “Happy Together” desmancha-se ao longo do filme, incapaz de lidar com a solidão e um amor tóxico; e o Chow de “In the mood for love” e “2046” um modelo de repressão interna, a comunicação feita com a posição corporal, o olhar, longos suspiros de fumo de tabaco espaços interiores: um estilo de actuação onde actuar é indistinguível na realidade. Toda a frustração e tristeza acumuladas é como um segredo indecifrável, olhando para um vazio silencioso, a tristeza a rebordar os olhos sem explodir. Leung ganharia um prémio de Melhor Actor em Cannes por esta performance e a partir daí, torna-se no nome maior do cinema de Hong Kong.
A participação em grande épicos históricos como Red Cliff, thrillers policiais como “Infernal affairs” ou filmes de artes marciais mais cuidados como “The grandmaster” reforçam o seu estatuto de estrela; mas a sua grande performance é em “Lust, caution”, como um Mr. Yee misterioso, pervertido, de certa forma uma imagem-negativo do Chow que interpretou anteriormente para Wong-Kar Wai, mas mais visceral, mais selvagem. Um predador do controlo e tudo transmitido pelos olhos venenosos de Tony Leung. Ele é um híbrido oriental de George Clooney e Robert de Niro, o ar misterioso de galã e o consumado actor de técnica inquestionável. Leung é uma anomalia, uma estrela estrangeira que raramente se aventurou em Hollywood e quando o fez, no Universo Marvel, realizou-o nos seus próprios termos. Incontornável na sua importância no Cinema contemporâneo, uma torre inquebrável de talento no cinema oriental.